quarta-feira, 28 de setembro de 2011

4)-RENCARNAÇÃO - OLVIDO NÃO ABSOLUTO.


Lucio Giunio Bruto

Giancarlo Dardi














Inúmeras almas, quando interessadas na continuidade dos empreendimentos que largaram ao encerrar o estagio na matéria, sentem-se irresistivelmente atraídas para a reencarnação afim de prosseguir na tarefa assumida. É o caso de homens e mulheres que retornam voluntariamente á esfera física afim de dar continuidade as mais variadas missões.
O progresso delas, no entanto, seja na esfera espiritual como material, é comparável á transposição de uma alta montanha pois lhes cabe sofrer naturalmente as dificuldades e as fadigas da marcha, além dos embaraços e armadilhas, miragem e espinheiros que elas mesmas cunham. E não se diga que todos os infortúnios da nova marcha são dívidas do passado, porque com a irreflexão e prudência, preguiça e trabalho e o bem e o mal sempre possíveis, podem melhorar ou agravar a respectiva situação, pois há que se reconhecer que no dia-a-dia, no exercício da própria vontade, novos ensejos podem ser constituídos remanejando o destino.
Diante disso, paternidade e maternidade, raça e Pátria, lar e sistema consangüíneo são conjugados para que não faltem ao reencarnante as ferramentas necessárias ao êxito no empreendimento que reinicia. Deste modo, mantém-se senhor das experiências adquiridas que lhe despontam do ser em forma de tendências e impulsos. Recebe então o espírito um novo corpo físico (cujo semblante e características refletem o corpo espiritual), em olvido temporário, mas não absoluto, das experiências pregressas. É assim que, ao longo do seu novo estágio na matéria, vez ou outra, diante de trechos de história ou imagens de seus protagonistas, revivem emocionalmente os bons ou maus episódios que na época, vestindo outro corpo físico enfrentaram. 
Por isso, ratificado por meus mentores, tenho consciência que já fui padre, e como tal, secretário do Papa Gregório VII cujo pontificado decorreu entre 22 de abril de 1073 e 12 de maio de 1085 e muito antes disso, na Roma antiga, Lucio Giunio Bruto.

 

Em 510 a. C., cassado o ultimo rei de Roma Tarquínio o Soberbo pela revolta liderada pelo nobre Colatino, porque, dizia-se, a esposa deste havia sido ultrajado por Sesto, o filho do monarca, Roma se libertou da dominação Etrusca.

Havia outras razões, entretanto, visto que diante do permanente crescimento deste futuro império, o rei não conseguia mais desempenhar suas responsabilidades. Além disso, ao tornar-se déspota, arrancara dos patrizi o poder político.

Esta nova conjuntura alterou o equilíbrio entre as classes dos patrizi e plebeus, porque, mesmo se o poder do legislativo, executivo, judiciário e militar era exercido por magistraturas diferentes, permanecia de contínuo nas mãos de cidadãos da classe dos patrizi. Este fato acabou gerando uma revolta que desencadeou lutas fratricidas que se prolongaram por anos até que os plebeus obtiveram acesso ao cargo de cônsul, tribuno e entre os que geravam as leis escritas. Um triunfo que incluiu a extinção da lei que proibia o casamento entre pessoas das duas classes.

Em Roma, então, nasceu a Republica Consular, isto é, dois Cônsules - os primeiros dois foram Lucio Giunio Bruto e Lucio Collatino - que de trinta em trinta dias se sucediam no comando, mantendo, entretanto, o recíproco poder de veto as decisões do outro. Todavia, a solução dos problemas de maior gravidade era de pertinência do Senado. Estes, ao termino de seu mandato, eram confirmados por mais um período ou substituídos.

Foi uma mudança radical porque o poder passou ás mãos de duas pessoas, e não de uma como havia sido durante a monarquia. Havia discordância, entretanto, porque Tarquínio o Soberbo, do exílio, empregava sua riqueza para corromper senadores e pessoas influentes para que lhes preparassem o retorno. Inesperadamente, devido à delação de um servo chamado Vindicio, um documento contendo o nome dos lideres do movimento que desejava restabelecer a monarquia foi entregue ao cônsul Lucio Giunio Bruto. Qual sua surpresa ao constatar que entre os conspiradores havia seus filhos Tibério e Tito.

Foi assim que diante da decisão do Senado, de que para preservar a Republica, e Roma, os insurrectos deviam ser executados, coube ao Cônsul Lucio Giunio Bruto ordenar a execução de seus próprios filhos.
O consulado de Lucio Giunio Bruto terminou em 509 a.C. no decorrer de uma batalha com os Etruscos, aliados dos Tarquinios para restaurar o poder em Roma, quando, enfrentando Arruante Tarquínio - o filho de Tarquínio o Soberbo, os dois, estimulando o galope de seus cavalos, se mataram mutuamente com suas lanças.




sábado, 29 de janeiro de 2011

3) ANUINDO

Fechei a empresa, sofrendo as consequências financeiras correspondentes, e continuei frequentando o centro. Terças feiras: educação mediúnica. Quintas: palestras, tornando-me orador e passista. Sextas: desobsessão e sábados a tarde visita a enfermos.
Foi numa quinta feira, no tempo em que ainda não começara a trabalhar, que presenciei uma cena tocante. Dois rapazes, da equipe de visitas, entraram carregando uma moça tetraplégica, ao redor de 28 anos, para assistir a palestra da noite.
Desloquei-me até ela para ajudar, porque seu pescoço não segurava a cabeça, e quando a palestra terminou perguntei-lhe o nome, se apreciara a palestra e se os rapazes a levavam ao centro de contínuo. A Lucídia, esse era seu nome, disse-me que era a primeira vez, que gostara, mas que eles não tinham como buscá-la, carregá-la e retorná-la todas as quintas feiras, mesmo porque os 76 degráus que havia para descer e subir eram muito cansativos. Moro com minha mãe, uma senhora idosa que, além de me alimentar, vestir e banhar, nada pode fazer.
Sem me dar conta disso verbalizei: se quiser a partir da próxima quinta vou te buscar e levar de volta. Olhou bem nos meus olhos e respondeu: tem certeza que quer isso? Confirmei.
Se era relativamente fácil descer os 76 degraus com ela no colo, subi-los, ao retornar, com certeza não era. Mesmo assim, prazeirosamente, fiz isso por cerca de três anos. Só parei quando ela o pediu.
Cerca de dois anos mais tarde, uma sexta a noite, enquanto envolvido por uma entidade dava passe após a desobsessão, ela me perguntou: "VOCÊ GOSTARIA DE TENTAR TRABALHAR COMIGO? DISSE TENTAR PORQUE NÃO É FÁCIL. É NECESSÁRIO QUE HAJA MUITO INTERESSE DE TUA PARTE E AFINIDADE ENTRE OS DOIS." Indaguei, quem é você? Dr. Émil Coué, respondeu. Claro que sim, respondi sem esitar.
As escuras? Não, porque naquele centro ele era conhecido mesmo se não lá não desenvolvia nenhum trabalho. Interviera para salvar um diretor do centro que estava enfermo e desenganado pela medicina. Se alguém quiser saber mais basta acessar: http://metodologiacurativa.blogspot.com/, ou ler a seu respeito em uma enciclopédia qualquer.
Meses após, uma noite, enquanto levava a moça para casa, o Émil perguntou: Giancarlo, gostaria de ajudar a Lúcidia? Sim disse. Sugeriu que adquirisse o livro "Magnetismo Espiritual", pelo espírito Michaelus, e o estudasse. Semanas mais tarde iniciou o tratamento com magnetizações. Cerca de três meses depois começou a se movimentar e logo mais passou a se vestir e se alimentar sozinha. Quando levada ao chuveiro, tomava banho também.
Para que pudesse se levantar, sem a ajuda da mãe, idosa, pousemos uma cadeira ao lado da cama com 20 tijolos empilhados sobre o assento. Tempos depois, após se levantar, pegava o andador que lhe fora regalado e andava pela casa.
Um sábado a tarde, quando a visitamos, a encontramos louquinha para relatar o que acontecera.
Gian, ontem, depois de muitos anos, o padre da minha igreja veio nos visitar. Deixara de fazê-lo devido a uma enfermidade. Quando entrou, Gian, levantei da cama e, segurando-me na cadeira, correspondi ao seu abraço. Soluçava. Ai, quis saber o que acontecera comigo. Lucídia, repetia, eu vinha aqui aos domingos para orar contigo, te comungar e pedir a Deus e te fizesse andar. Mas nada aconteceu! O que houve.
Sabe, Gian, eu fiquei com medo, medo porque você é espírita e ele é um padre católico. Só que ele insistiu tanto que acabei falando de você e tudo aquilo que você fez por mim. Gian, chorando ele disse. Filha, Deus é um só. O moço fez aquilo que eu não consegui. Se estivesse aqui, agora, nos três, juntos, agradeceríamos ao pai mais uma vez.
Corriam seis meses, quando, continuando a visitá-la ao sábados, a encontramos desesperada. Chorava e dizia que tinha que nos contar algo que não queria. Não queria, mas precisava por causa da mãe.
Gian, finalmente disse. Lembra da história do padre? Pois bem ele foi substituído por outro jovem. Visitou-me ontem e quis conhecer a minha história. Iniciei relatando que oito anos atrás, por ter desmaiado enquanto trabalhava, fui levada ao hospital. Que naquele nosocômio sofri uma cirurgia no cérebro para extrair um tumor e que seis meses depois, quando me deram alta, eu era tetrapégica. Relatei, ainda, tudo o que dissera ao padre que ele substituiu por achar que a atitude dele seria a mesma. Deus não é um só? Devia ter calado a respeito da última parte, porque ele ficou zangado. Falou, falou, e terminou dizendo que eu devia escolher. Ou continuar indo ao centro com você e ter teu tratamento, ou ficar com Deus, porque Ele, através da comunhão, me curaria de vez.
Ai, Gian, minha mãe, que até aquele momento ficara quieta, virou para o padre e disse que era ele, e não você, que queria receber em sua casa. Desculpa, Gian. Obrigado por tudo aquilo que fez por mim finalizou chorando. Por favor, não volte mais.
Um anos depois fomos lhe fazer uma visita. Não era mais a mesma Lucídia em termos de alegria, e infelizmente regredira. Este foi o meu batísmo de médium de cura.
Por serem os homens, em sua maioria, seres imperfeitos, o pessoal daquele centro, como o padre jovem, achou que a evolução da Lucídia se dera por causas naturais. Se assim não fosse, diziam, teria sido o médico espiritual do centro, não o Dr. Émil, a curá-la. Haviam "esquecido" que o relato dos socorristas que visitavam a Lucídia antes dela passar ao meu grupo, esclarecia que até aquela data, desde que recebera alta do hospital, nem sequer conseguia se alimentar sozinha. Dependia da mãe em tudo e de uma irmã que só conseguía visitá-la uma vez por semana.
Outras ocorrência, entretanto, somaram-se antes que os meus mentores, agora três, me solicitassem deixar aquele centro espírita. Deixá-lo, após dez anos de trabalho. As instituições, diziam, quais quer que elas sejam, religiosas, científicas, de ensino etc.etc., para algumas pessoas representam tão somente o início do aprendizagem. Há indivíduos que "dentro de si" possuem a catapulta que os lança sempre mais adiante. Einstein, por exemplo, com 15 anos, antes mesmo de frequentar a escola, já se dedicava ao estudo da velocidade da luz. Afirmava que se uma astronave, voando a velocidade dela, levasse um gémeo ao espaço, este se manteria mais jovem do que seu irmão na Terra.
Aquele centro, aos sábados a tarde, recebia cerca de 200 crianças para evangelizar e as diretoras daquela atividades eram duas moças contando entre 23 a 25 anos. Hora, duzentas crianças, sentadas lado a lado no mesmo espaço dificilmente permanecem quietas. Por isso, as duas moças nem sempre conseguíam manter o comportamento mais adequado com elas. Foi assim que uma tarde, ao presenciar certas atitudes, permiti-me dizer-lhes: Se estivesse aqui o cara que disse "deixai vir a mim as criancinhas", com certeza desaprovaria o comportamento de hoje. Eu não sou Jesus Cristo, respondeu-me uma delas alto e bom tom. E naquele fim de tarde, ao retornar, o presidente me chamou para dizer: Sr. Giancarlo, a mas moças tem razão, nos não somo Jesus Cristo.
Claro, repliquei, mas, quando uma instituição como essa ensina o evangelho, o escopo não é ensinar seus preceitos? Então, claro que não somos Ele, mas temos a obrigação de aprendermos seus ensinamentos. Não é com este objetivo que o Mestre veio...Sai para não ter que continuar a discussão.
Há muitos e muitos anos anos me habituei a correr ou marchar 12 Km. todas as manhãs, e em uma delas, enquanto corria, um cachorro grandão, um Akita gigante, se desvencilhou da coleira e, mordendo meu braço esquerdo, quase o destruiu: 1.500 pontos. Deixei de ir ao centro por alguns dias, e quando retornei, o diretor quis saber o que acontecera. Sua manifestação, após o relato, foi. O dono do cachorro tem dinheiro? Sim respondi, muito mesmo. Então, mostra que você é espírita mãs não troxa. Contrata um bom advogado e tira todo o dinheiro dele porque a lei te favorece. Eu também tinha um cão, então, como possuía um convénio médico, limitei-me a aceitar aceitara a oferta que o proprietário me fizera: Ressarcir as despesas com medicamentos.
Por estas razões e outras similares, semanas depois desta ocorrência pediram-me para deixar de frequentar o centro. E quando lhes perguntei se devia procurar outro, a resposta foi: Não, nos cuidaremos de você deixa que os outros sigam a sua estrada.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

2)- CONVOCAÇÕES

A)Lembro-me que o título do primeiro livro que me foi dado para ler era "Cuore" (coração), contos que historiavam os feitos heróicos de crianças antes, durante e depois da primeira guerra mundial. Em um deles a mãe morrera, e a partir daquela leitura, que repeti mais e mais vezes, passei a desconfiar que perderia minha ainda criança.
B)Os vai e vem da vida fizeram com que muitos anos após estarmos no Brasil meu pai se mudasse para o Rio de Janeiro. Por não gozar de boa saúde, vez ou outra eu e meu irmão íamos visitá-lo. Em uma destas ocasiões nos disse que um amigo o levara a frequentar um centro de umbanda para fazer um tratamento espiritual, atendimento este que naquela noite tinha outra seção. Nos, por sermos Católicos Apostólicos convictos, não aceitávamos a existência de espíritos, aliás, nos recusamos a ouvir quando disse que passara a se sentir melhor após se sujeitar aquele tipo de cura. Pai, está louco. Só no Brasil existem estas teorias. Ele insistiu tanto que resolvemos acompanhá-lo. Está claro desde já, repeti, que não iremos entrar. Vamos te aguardar no carro até você voltar.
Chegamos em Madureira e em seguida a em um grande gramado onde havia uma casa iluminada de onde vinham sons de cantos e batuques. Ele foi e nos permanecemos. Passaram 15 minutos, e, ei-lo de volta acompanhado por três indivíduos de branco. Pensei... não dá para confiar nem no pai!
Após as apresentações, um deles nos perguntou porque não o havíamos acompanhado. Somos católicos Apostólicos Romanos, respondi. Não aceitamos estas coisas como vinda de Deus. E se não são de Deus.....
O diálogo continuou educadamente do lado dele, e com uma certa agressividade do meu, até que inquiriu novamente. Você ora. Claro, respondi. Ora para quem? Para Deus, Jesus, Nossa Senhora. Se sente seguro quando ora ? Sim, respondi, tenho certeza que sobrevivi á guerra devido as minhas orações. Então, se você nos acompanhar, e, enquanto estiver conosco, orar, vai se sentir seguro? Sim, respondi... sem perceber que caíra em uma cilada.
Uma vez no centro nos colocaram no meio de uma roda de pessoas "tomadas" que cantavam, bebiam e fumavam. Em seguida, mesmo orando a mil, senti uma sensação que nunca experimentara. Incorporara
Findo o culto nos acompanharam até o carro e ao se despedir um dele sublinhou. Você é médium, amigo. Tem que usar tua mediunidade para ajudar o próximo. Se não o fizer pode se dar mal. Dias depois, em São Paulo esqueci o episódio.
C)Casei, separei, e anos depois meu sogro faleceu. Fui ao enterro, e quando o caixão foi aberto na capela do cemitério para a última despedida eu me encontrava a alguns metros conversando com amigos, quando as palavras "Giancarlo, você está separado mas por favor cuida da minha filha" ecoaram alto e bom som na minha mente. Pó, estávamos falando a respeito da noite anterior, noite em que havíamos estado em uma festa, portanto nem de longe estava pensando no ex sogro. Como, então, ouvira aquilo. Devia estar louco, pensei.
D)Em 1975 conclui a construção de uma linda casa, e nela, uma suite adicional para hospedar meu pai vez que prometera vir a habitar conosco. Uma promessa que apesar de insistente jamais cumprira. Para não dar trabalho, dizia, e permanecia no Rio de Janeiro sozinho.
No ano seguinte, no meu aniversário, me passaram o telefone dizendo: uma ligação do Rio. Atendi crendo que era meu pai para me parabenizar..... Enganara-me, era um amigo dele para comunicar que falecera.
Fomos ao Rio para o funeral e dois dias após, em casa, passando ao lado da suite que construíra para ele, senti a sua presença. A certeza de que ele estava lá era tão irrefutável que me assustou, amedrontou por refletir uma manifestação pós morte na qual não acreditava. Tentei, mas não consegui entrar.
Mais três dias e a presença dele sumira. Fiquei em paz porque passei a crer que, como os Evangelhos relatam que três dias após a morte Jesus ressuscitara, pensei que acontecera o mesmo com ele.
E) Cerca de dez anos depois aluguei um imóvel para abrir uma pequena empresa porque aquela em que eu era diretor estava sendo levada a falência. Por mais que procurasse, nenhum imóvel me atraia, até que uma manhã, indo direto para a Vila Mariana, me vi em frente a uma casa que me atraiu. Entrei, e, mesmo tendo um grande salão parcialmente destruído, a aluguei sem pestanejar. Ao conhecer os vizinhos, depois disso, fui informado que naquela casa nenhuma empresa ia para a frente, e quem destruíra parcialmente o salão fora o último locatário em um acesso de raiva. Eu, entretanto, desde que a alugara, me sentia muito bem dentro dela, como se emanasse paz. Era Novembro de 1991.
Uma noite, indo para casa por volta das 22:00 horas, fui envolvido por uma sensação, uma percepção de que algo grave iria me acontecer naquela noite. Por precaução passei a dirigir cercando-me de cuidados. Mantinha-me a direita, olhando repetidamente para todos os lados para me acautelar. E quando a distância percebia que o semáforo não estaria a meu favor ao chegar a ele, diminuía a marcha até ter noção que podia seguir.
Na Rua Américo Brasiliense, em Sto. Amaro, mesmo dirigindo defensivamente, tendo a favor a luz que emanava da Sabesp, quando acelerei porque em segundo o farol ficaria a meu favor, algo bateu no carro. Olhei de soslaio sem para de acelerar, para frações de segundo após me dar conta que havia um indivíduo com uma arma na mão. Tarde demais. Houve um tiro, o vidro a minha esquerda estilhaçara.....e em segundos, cientificando-me que estava fora do alcance de um, novo disparo de graças a Deus porque não havia sido atingido.
Crera isso porque nenhuma dor sentira, mas, agora iluminado pelas lâmpadas da Av. Sto. Amaro vi minha camisa ensanguentada. Assustado, virei o carro e adentrei no hospital ali sediado. Foi atendido, medicado e, mesmo sem entender porque um dos médicos queria me internar, me deram alta pedindo para que no dia seguinte fosse a um hospital do meu convénio para os curativos. Levei um susto porque quando a enfermeira disse que havia três buracos de bala, também informou que isso significava que a bala permanecia no corpo. No braço esquerdo, na altura do coração, a bala entrara e, ao sair, continuara seu trajeto adentrando no tórax. O chefe da cirurgia, chamado as pressa, pediu a realização de uma radiografia de hora em hora. Quando meu relógio indicava 18:00 horas, quer dizer, dez horas sem me alimentar ou beber, retornou com as radiografias na mão para me dizer que passaria por uma cirurgia cirurgia. O escopo era o de verificar se a bala, que após atravessar o tórax se alojara sobre o rim direito, causara ferimentos em minhas entranhas. Milagre, não.
Na manhã seguinte veio ao quarto e disse: "se nem São Pedro te quer, te dou alta. Permaneça em repouso por uma semana, porém." Agora vou te dizer uma coisa que jamais vai esquecer: você não morreu porque Deus não quis, sua mão deve ter manuseado o prejétil. Aliás, como ninguém sobrevive a um ferimento deste, por ser professor na Sta Casa, se me autorizar vou utilizar seus exames em minhas aulas. Anui.
Ao longo dos dias seguintes, em repouso, suas palavras: "você não morreu porque Deus não quis", permaneceram ecoando na minha mente, até que conclui que o destino continuava a cuidar de mim. Mas, algo me perturbava. Se eu tivesse morrido, teria ido embora sem nada obrar em favor do próximo, aliás, ao contrário, porque nos papeis profissionais que exercera sempre fora muito intransigente. Assim, a minha percepção em relação ao universo que orbitava ao meu redor começou a mudar. Mudou com tamanha magnitude que quando retornei ao imóvel que havia alugado, onde antes do acidente me sentia em plena paz, comecei a "ver" coisas que jamais sonhara e que contrariavam frontalmente o credo da minha religião. Via espíritos na casa inteira, entidades que me diziam curto e grosso que devia deixar a casa porque era deles. E na medida em que não acreditava no que via, passei a ser perseguido por elas, assim como meus funcionários. Os clientes, então, segundos depois de entrarem, por não se sentirem bem, saiam. Descobrira porque nenhuma empresa parava no local e não para até hoje.
O espírito daquele que havia sido o dono da casa, um velho italiano que morrera nela porque a família, segundo ele, não queria gastar mantendo-o no hospital, dizia: "tem que sair. A casa é minha, tenho documentos que comprovam isso. Agradeceu quando foi pintada, alertando, porém, que se não saísse as coisas iriam piorar para mim.
Via, ouvia, portanto tinha que acreditar, mas me recusava a isso. Por conseguinte fui até a Igreja de São Judas e pedi ajuda a um padre exorcista. Foi, fez o trabalho dele, molhou a casa com água benzida, mas quando saiu sentia-se mal. Ao voltar, simplesmente fui agredido como até então não havia sido. Não dava para permanecer no recinto da casa.
Para me ajudaram levaram-me a um centro de umbanda, entretanto, logo mais deixei de frequentá-lo por não me sentir a vontade, entre outras coisas, porque a entidade que passara a me acompanhar agredia todos os que permaneciam por algum tempo do meu lado direito. Quem permanecia segundos após passava a sofrer fortes dores de cabeça.
Foi a vez da Federação Espírita. Fui e permaneci por algum tempo. Palestras, passes, Evangelho no lar, orações, contudo, "eles" ficavam cada vez mais agressivos mesmo se entre eles havia alguém que tentava me ajudar. Tentava, porque em seguida apanhava também. Quando relatei a uma senhora que o trabalho da Federação Espírita em nada ajudara, me levou ao diretor mediúnico da instituição André Luíz. No fim do diálogo disse-me que algumas entidades haviam se manifestado e prometido ir embora, mas, completou, por ser médium você tem que trabalhar para ajudar o próximo, assim vai encontrar ajuda. Nenhuma mudança....
Se passasse a frequentar um centro cardecista, diziam, encontraria a solução. Permaneci em um deles por alguns meses até outro frequentador, que se tornara amigo, dizendo-me: aqui a "lixa é muito fina", me levou a outro. Esse organizou uma seção de desobsessão na casa. Aprendi, com isso, que desobsessão nada mais é do que um trabalho de evangelização, e só as entidades sofredoras, aquelas que, por crer em Deus, entendem que evangelizando-se encontrarão amparo no alto. Infelizmente as ruins, as malignas, permanecem e ficam ainda mais agressivas. Aparentemente não havia solução, mas, teimoso, permaneci no imóvel. Continuei até, como acontecera com meus antecessores, ter que encerrar as atividades.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

1)- BATISMO DE FOGO




Nasci em 1934 em Bologna, Itália, primogénito de quatro irmãos, filho de pais Católicos, mãe professora e pai funcionário do Ministério do exterior. A consequência natural foi seguir os preceitos da Igreja Romana alem de ir residir em Paris -França, com poucos meses de vida.
Paris, a cidade luz... Foi lá, no magnífico jardim de Versalhes, que mesmo sem ter noção disso vivi a primeira aventura: O carrinho de bebe em que eu dormia foi levado por estranhos enquanto minha baba namorava. Horas após fui achado chorando entre um canteiro de flores.
Em 1939 uma decisão de meu pai o levou a demitir-se e, após adquirir e despachar para este País máquinas e suprimentos, em Novembro daquele ano veio também. Em Fevereiro do ano seguinte, instalado em termos de residência e organizado produtivamente, pediu a minha mãe que providenciasse a vinda. Em Junho, enquanto estávamos em Génova aguardando o embarque, Mussolini, o líder da República Social Italiana, inseriu o País na segunda guerra mundial ao lado de Eixo e declarou guerra à Inglaterra e a França.
Era o dia 10 de Junho de 1940. Sem outra alternativa voltamos á Bologna onde minha minha mãe, além de cuidar de nos quatro, teve que lutar para reorganizar a vida.
Quatro meses após, em Outubro, a Itália, que já estava em guerra com a Líbia, atacou a Grécia. Nesse novo fronte, no entanto, seu exercito, por se defrontar com tropas bem treinadas e melhor armadas, foi rechaçado até a fronteira da Albânia. Mas não era só neste País que o ímpeto guerreiro do Duce estava sendo detido, porque os ingleses, agora lutando lado a lado com as tropas líbias, estavam levando a melhor. Até que em maio daquele ano, vencedores, recolocaram no trono Líbio o rei Hallé Selassié. Concomitantemente a Inglaterra passara a bombardear os navios de guerra italianos ancorados no porto de Taranto. Mesmo assim, Mussolini enviou 230 mil homens para a Rússia com o escopo de ajudar os alemães a invadí-la.
Em 1942, enquanto as tropas do eixo começaram a sofrer as primeiras derrotas, os Aliados, fortalecidos com o esforço industrial americano, passaram a bombardear cidades italianas no norte da península, e entre elas, Bologna, nossa cidade. Com oito anos, enquanto minha irmã caçula contava três, tivemos que nos adaptar aos horrores das cidades destroçadas pelas bombas.
Logo foram instalados sistemas de alarme que nos faziam correr quando soavam. Correr para tentar preservar a vida porque em seguida chegavam os caças que escoltavam os B-29, as fortalezas voadoras que despejavam centenas de toneladas de bombas.
Correr para onde? para os espaços públicos que haviam sido construídos para aguentar até um impacto direto se estivéssemos na rua, ou para o subsolo do prédio em que habitávamos onde havia sido edificado um cubículo com este fim. Todavia, como ambos os lados construíam bombas cada vez mais destrutivas, logo os abrigos deixaram de ser seguros.
A psicologia diz que os traumas de guerra não tem cura, e que os pacientes, para conviver com eles, tem que ser de continuo medicados. Não é o meu caso, não é o caso dos meus irmãos e também não é dos amigos da época com os quais ainda me relaciono, porque conviver constantemente com o perigo, quando não há o que fazer para evitá-lo, faz com que a gente se torne imune a ele. Claro, a religião, qualquer que ela seja, ajuda, mas é preciso entender e aceitar que a morte, com ou sem guerras, sempre faz suas vítimas porque o nosso mundo é cruel. Há a crueldade dos homens, a das enfermidades, a do clima via tempestades, ciclones etc. a crueldade das forças do globo, terremotos, maremotos, tsunami etc. Há a crueldade dos animais nem que seja via cadeia alimentar e a crueldade das plantas porque também entre elas há as que matam. Sim, a crueldade do universo, porque vez ou outra a Terra é atingida por cometas. Nem por isso a vida deixa de rolar normalmente. Então, mesmo com bombas havia a escola, o estudo, as brincadeiras de rua e vez ou outra o cinema. Consequentemente, na rua, quando longe de um abrigo, como as bombas não caem verticalmente, a gente corria no sentido oposto.
Nesta época o bombardeio não era diário, mas a noite havia sempre o voo solitário de um aeroplano que chamávamos Pippo, avião que despejava suas bombas onde havia luz. Por exemplo, a pouca luz de uma janela quando não perfeitamente vedada com tela preta.
Lembro de uma noite, enquanto nos dirigíamos ao cinema para ver o gordo e o magro, ao mesmo tempo em que percebemos a presença do Pippo, ouvimos os gritos de um vigia noturno gritando: apaguem a luz, apaguem a luz. Corremos para nos afastar do local e em seguida ao silvo da bomba, como sempre acontecia, houve a explosão. Só mais uma entre as dezenas que ouvíamos diariamente. Seguimos em frente, fomos ver o filme e nos divertimos muito.
Os dias se sucediam rotineiramente até que os Aliados, após planejar o desembarque na Sicília, começaram a bombardear a Itália quase diariamente. Noite e dia quarteirões inteiros eram arrasados. Então minha mãe, após conseguir uma cadeira em uma cidadezinha a 35 Km. de Bologna, contratou um caminhão e fizemos a mudança.
Parecia outro País, porque naquele lugar, por não ser um ponto estratégico naquele momento, havia paz. Paz, mesmo se havia uma divisão alemã aquartelada. Homens, alguns deles pais saudosos dos filhos distantes, que talvez para salvaguardar parcialmente a quietude interior, vez ou outra nos regalavam alimento, que era escasso, e golusemas. Julgando-nos a salvo, acompanhávamos o desenrolar da guerra por meio do rádio de ondas curtas que, por ser proibido, mantínhamos oculto.
Chegou Maio de 1943, e nele, as forças do Marechal de Campo Rommel, a raposa do deserto, se renderam aos ingleses na África do norte, e em Junho foi a vez dos Aliados desembarcarem na Sicília. Acossado, Hitler, que precisava manter suas posições a qualquer custo, enviou mais tropas á Itália, e entre elas, as da SS. Os notórios anjos cruéis da guerra por serem os defensores da ideologia nazista. Depois disso, em todas as latitudes do País civis italianos passaram a ser considerados inimigos do Fuhrer.
A esta altura dos acontecimentos, como em todos os demais países tomados pelos alemães, a resistência (na Itália os partizans), agora em maior número e armada pelos aliados, começou a cruzada contra os inimigos, inimigos que as vezes eram seus próprios irmãos porque os alemães, ao desconfiar que alguém da resistência havia sido abrigado por civis, reuniam a família em sua própria casa e, após forçar os vizinhos a se tornarem espectadores, impregnavam suas paredes de gasolina e ateavam fogo.
Chegou-se ao ponto que, para cada alemão morto eram fuzilados os primeiros dez italianos que encontravam. Inversamente, quando eram os os partizans que supunham que um italiano favorecia os alemães, na melhor das hipótese lhe raspavam a cabeça e a cobriam de piche. Lembro de quatro episódios como se tivessem acontecido a semana finda:
Ser arrastado com minha mãe e irmãos, além de quantos residiam nas adjacências, para assistir a queima de uma residência, com seus habitantes dentro, claro, e lá sermos obrigados a permanecer até o último grito daqueles que estavam queimando vivos.
Ter estado presente quando, após escolher 10 adultos, foram colocados contra a parede para serem fuzilados. A tragédia só não aconteceu porque o ferimento no alemão não fora letal.
Assistir á degola de um rapaz pela espada de um oficial da SS porque se recusara a parar quando lhe deram voz de prisão.
Ser acordado de madrugada em minha própria casa por um grupo da resistência porque, como minha mãe era professora, entendiam (ou alguém havia feito uma denuncia) que durante as aulas falava bem do III Reich. Nos reuniram para comunicar que ali estavam para lhe raspar e cobrir de piche a cabeça. Diante dos argumentos dela, e do nosso desespero, foram embora ameaçando voltar se fosse o caso.
A guerra, agora, estava sendo vencidas pelos Aliado, mas Hitler entendia que devia resistir a qualquer custo porque seus cientistas estavam desenvolvendo armas que, se ultimadas em tempo, lhe dariam a vitória: A V-II, o míssil balístico que, disparado na Alemanha chegou a fazer milhares de vítimas em Londres. A bomba atómica, que acabou sendo desenvolvida pelos americanos, e algo super secreto que aparentemente também caiu na mão dos americanos: um disco que voava.
O esforço alemão passou a exigir cada vez mais homens, homens que escasseavam porque os disponíveis estavam todos nas frentes de batalha. O jeito, então, foi alistar moços, moços que as vezes iam para o fronte mesmo sem serem treinados. Dai, a necessidade de recrutar crianças para doutriná-las e prepará-las militarmente. Na Alemanha, creio eu, um sem número de pais enviavam seus filhos de bom agrado, claro, ainda consideravam-se a "super raça". Mas nos países invadidos os moços se escondiam ou se alistavam na resistência.
Nesse cenário, numa manhã de inverno, após uma nevasca que acumulara 40 centimetros de neve no chão, caminhões cheios de armamento foram retidos por uma avalanche a cerca de dois quilómetros de onde habitávamos. Soubemos disso quando três oficiais se apresentaram e perguntaram a minha mãe onde estava o marido. Estavam irritados porque no local só havia velhos, mulheres e crianças.
Por sorte, via Cruz Vermelha, vez ou outra recebíamos uma carta do pai, e foi uma dessas, atestando que morava no Brasil, que naquele momento nos livrou do pior. De momento, porque os velhos que haviam sido levados ao local da avalanche não estavam dando conta do recado. Então, resolveram pegar as crianças maiores para ajudar no trabalho. Uma ideia infeliz, bastou que alguns moleques fossem arrancados de suas casas para que se espalhasse a voz que estavam sendo levados para a Alemanha. Então, gritos e preces começaram a ecoar, as preces para rogar ajuda ao Alto, e os gritos quando as mães eram agredidas porque lutavam com os soldados para impedir que levassem seus filhos. Minha mãe uma coronhada.
Como sempre há um fim, qualquer que ele seja, este foi bom porque quando os veículos finalmente seguiram caminho os alemães despacharam todos para casa. Só eu fora resguardado, porque quando o oficial maior me viu com uma pá na mão, mandou que voltasse correndo para casa.
Diz-se que o tempo voa, mas naquela época era vagaroso porque os aliados, devido á forte resistência alemã, não ganhavam terreno com a rapidez que os italianos desejavam. Destarte, mesmo recheado de brincadeiras e alguns sustos, parecia paralisado. Foi uma alegria saber que no dia 22 de Janeiro de 1944, um segundo desembarque aliado, desta vez em Anzio, uma região do Lázio, província de Roma, tinha o escopo de, ao cortar os suprimentos que mantinham operacionais as tropas do Eixo que lutavam no sul, fazer com que se rendessem.
Depois disso, nós, que ansiávamos pela chegada dos libertadores para livrar a Itália do controle alemão, nos vimos frente a frente com uma realidade não imaginada. Com o com avanço aliado, antes ou depois, fatalmente, viríamos a nos encontrar na terra de ninguém, o espaço que por um tempo indeterminado permanece entre dois fogos. Então minha mãe decidiu que era hora de retornar á Bologna, mas não era tão fácil assim, pois ao longo da estrada, mesmo sendo de 35 quilómetros, havia nada menos do que cinco comandos alemães, comando que, mesmo defendidos com unhas e dentes, eram atacados por caças e bombardeiros de cinco a seis vezes por dia. Além disso não havia transporte, mesmo porque, se alguém ainda dispusesse de um veículo qualquer o mantinha escondido para evitar seu confisco. Como, então, levar para Bologna além do que possuíamos, os viveres para sobreviver? Viveres que, se no campo já eram escassos, na cidade o pouco disponível encontrava-se no mercado negro? A alternativa foi alugar uma charrete, carregá-la, e levá-la pessoalmente até Bologna. Como eu era o mais velho, coube a mim acompanhar minha mãe nas oito viagens que se fizeram necessárias.
Planejamos, então, partir bem cedo pela manhã, chegar ao destino no fim da tarde e voltar a por o pé na estrada na manhã seguinte após uma noite de sono no apartamento de meus avós maternos.
Infelizmente, só uma viagem obedeceu a este padrão. Em três delas, ao ver ao longe os ataques aeréos nos detivemos para evitá-los, e acabamos pernoitando na estrada devido á hora tardia. Mas nas outras quatro não nós foi possível evitar o batismo de fogo. Não morremos porque o destino não quiz.
Em uma delas, após ter percorrido cerca de 10 quilómetros, fomos cercados por um grupo de partizans que nos ordenou sair da estrada e deitar sob a charrete. Logo, ecoaram tiros de fuzil, morteiro e rajadas de metralhadoras por infindáveis minutos. Quando minha mãe achou seguro seguimos viagem, metros adiante, porém, fomos novamente cercados, agora por alemães fortemente armados que aos gritos nos intimaram a parar. Fomos revistados, assim como a charrete e levados para uma clareira próxima. 30 minutos após nê-la havia cerca de 50 pessoas e uma metralhadora sendo fincada no chão. Soubemos, então, que os partizans havia atacado um posto de defesa antiaérea. Inútil descrever a angústia e o medo estampado na face de todos, até que, após horas de agonia, um motociclista, ao chegar, entregou a quem estava no comando um documento. Bastou este ato para que as preces, os gritos e o som do desespero se elevassem acima de qualquer outro ruído porque tudo levava a crer que haviam ordenado a nossa morte. Estranhamente foi o inverso. Naquela fase da guerra, as sucessivas vitórias dos aliados esculpiam nas mentes de um número cada vez maior de militares o desejo de se revoltarem contra Hitler. E nos soldados cansados de tanto lutar a ideia de desertar. Mais tarde, inúmeros deles passaram a propor a troca de relógios e alimento por roupas civis.
Naquela tarde, esgotados pelo que passáramos na clareira, aceitamos o oferecimento de um casal que estivera conosco e pernoitamos em sua casa.
Havia cinco comandos alemães ao longo da estrada, instalações que, por serem atacadas pelo ar de um momento para o outro (o aviso era o toque de sirene) a chegada dos aviões tanto podia nos surpreender antes, durante ou depois. Uma tarde, por volta das 16:00 horas, sem ouvirmos a sirene, a chegada dos aviões nos pegou nas adjacências do último deles, uma área de terras incultas cuja proteção se limitava aos fossos que haviam servido para irrigá-la. Sem alternativa (a carga da charrete naquele dia não oferecia amparo), corremos ao fosso onde minha mãe, após me deitar nele, se pós sobre mim. Vimos, deste modo, que cada vez que os caças desciam metralhando, os alemães corriam para se abrigar, e, quando subiam, deixavam o abrigo para disparar seus canhões. No inicio do embate, ao acertar dois aviões, obrigaram os pilotos a se lançar de para quedas, e lançando-se, a se tornarem alvo de seus fuzis. Isso provocou a revolta de seus colegas, vingança que, ao multiplicar a agressividade do ataque, arrazou com os alemães e suas armas. Não dava para crer, mas, uma vez mais estavamos ilesos.
A estratégia dos aliados, que vencendo de continuo os alemães seguiam deslocando-se do centro para o norte, era a de derrubar pontes e destruir estradas com o escopo de bloquear o envio de tropas e suprimentos além de cortar a retirada. Então, uma manhã, ao chegarmos nas vizinhanças da única ponte existênte avisaram-nos que fora destruída. Atônitos, estancamos, relaxando ao ouvirmos que os alemães, pela necessidade de deslocar suas tropas, haviam criado condições para atravessar o rio que corria sob ela. O curso d água, naquele momento com 50 centimetros de profundidade, não era problema, o difícil era galgar as encostas laterais com cerca de 8 metros de altura. Prisioneiros italianos, então, soldados que haviam se rebelado, foram trazidos, com tratores, para suavizá-las até permitir o trânsito de veículos. Seguimos, mas logo comprendemos que não possuíamos a força física para vencer o declive, atravessar o rio cheio de pedrase e subir do outro lado.
Estávamos sem saída, quando um prisioneiros aos poucos chegou perto e fez uma proposta. Senhora, disse, está sozinha com seu filho. Se eu assumir a charrete, enquanto vocês a empurram, os alemães, neste momento ainda não totalmente refeitos, vendo um homem e uma mulher con criança levando uma charrete cheia de de alimento e pertences, é provável que entendam que somos os pais da criança e nos deixem ir. Claro que podem perceber o truque, mas em casa tenho mulher e filhos que gostaria de rever. Minha mãe lhe cedeu o lugar e veio ao meu lado para empurrar.
Naquela fase, estando os alemães a perder a guerra, a crueldade das tropas da SS reinava. Os fugitivos eram assassinados barbaramente e quem os auxiliava .... Mas eram tropas comuns que nos rodeavam. Atravessamos o largo fluxo d água cuja profundidade chegava ao meu umbigo e subimos do outro...Estavamos sob os olhares germanicos, mas, nada aconteceu. Quilómetros após, o amigo agradeceu, se despediu e sumiu ao longe.
Mas a jornada não terminara. Na altura de outro comando mais uma vez fomos surpreendidos por um ataque aéreo. Como a charrete carregava sacos de grãos resolvemos nos protegermos sob ela. Minutos após o cenário era semelhante ao que haviamos vivido, só que, desta vez, vimos balas disparadas pelos caças atravessarem os sacos e se enterraram no chão bem pertinho de nossos corpos. A defesa? Orar uma oração atrás da outra até passar o perigo.
Mas foi na última daquelas viagens que por pouco não morri. Sabíamos que ao chegar á ponte destruída não teriamos como atravessar o rio, mas naquele período, para fugir da linha de fogo que se aproximava, muitas pessoas passaram a utilizar charretes para transportar seus pertences. De fato, ao chegar ao local encontramos outros em apuros. Minhã mãe, então, propôs que os mais fortes transladassem uma por uma todas as charretes enquanto os demais permaneceriam tomando conta delas onde estivessem paradas. Como dera a ideia, a nossa foi a primeira. Travessia, feita, permaneci ao lado dela a uns 300 metros além da margem do rio enquanto minha mãe e as demais pessoas retornavam para buscar a segunda.
Se há momentos em que o tempo é similar a uma rajada de vento este foi um deles. Estava pensando na possibilidade de ataque aéreo, porque o comando alemão estava a uns 500 metros á minha direita, quando ouvi o ronco dos motores se aproximando. Olhei na direção em que minha mãe ira e, não a vendo, deitei sob a charrete. Tinha ciência, entretanto, que a carga daquele dia, móveis, não oferecia nenhuma proteção. Assim, quando as primeira rajadas destroçaram parte deles, e os fragmentos dos projéteis antiaéreos, ao cair, passaram a levantar pequenas nuves de pó ao meu redor, decidi que devia saír dali para me abrigar em uma casa que distava cerca de 300 metros á minha direita, se conseguísse chegar, claro. Corri loucamente pela estrada de terra que levava até ela porque o o zunido das balas, as explosões e a queda dos fragmentos ao meu redor eram estímulo efetivo. Como a porta estava aberta, entrei. No saguão havia dois imensos toneis, um de cada lado, daqueles que contém vinho para envelhecer e atrás deles um velhinho orando.
Onde estão as demais pessoas da casa, perguntei? Naquele abrigo ali adiante, respondeu. É seguro, insisti. Claro, foi escavado sob a rocha da montanha. Porque o Senhor permaneceu aqui? Sou velho, se tiver que morrer, prefiro morrer em minha casa.
O Sr. é louco respondi, aprontando-me para sair. O louco é você, garoto, disse ele, tentando me segurar, porque não vai chegar vivo. Sai correndo até que fui jogado longe pela chicoteada de ar provocada pela bomba que ao explodir transformara a casa em que estivera em um monte de ruínas. Semi desmaiado, fui carregado até o abrigo.
Permaneci na entrada dele, tremendo, sem conseguir tirar os olhos daquelas ruínas, porque, se o velhino tivesse me retido por mais alguns segundos, naquele momento também estaria sob elas, morto.
Ainda zonzo, demorei para ouvir os gritos alucinantes de minha mãe, sob aquele inferno de fogo, chamando-me desesperadamente. Quando vira o perigo, como havia feito quando me cobrira com seu corpo naquele fosso, ao invés de procurar abrigo, correra até o local onde me deixara. Não me encontrando, permaneceu lá me chamando temendo o pior. Quando não vi você sob a charrete, disse depois ao me abraçar, pensei que, por ter procurado abrigo naquela casa, estivesse sob suas ruínas...
O que fazer? Sai correndo na direção dela até que, vendo-me, veio ao meu encontro. Abraçados, aguardamos o fim sob uma árvore. Mais uma vez, naquele dia, alguém não deixara que nada de mal nos acontecesse.
Meses mais tarde, devido ás cruciantes dores que há tempo faziam minha mãe gritar, um amigo nos levou de carroça puxada por dois cavalos para a casa dos meus avós. Finalmente conseguíramos retornar á Bologna.
Enfim, no dia sete de maio de 1945, após o suicídio de hitler, o que restara do governo alemão, ao se render, permitiu o fim da guerra na Europa. Dois dois meses após, em julho, a vida da minha mãe também chegava ao fim vitimada pelo cancer que herdara dos sofrimentos no decorrer da guerra.
Cada um de nós quatro, então, tornou-se hospede de um parente que até então não conhecia. Eu fui residir com um tio que tinha 11 filhos................Até que no dia 2 de Julho de 1952 embarcamos para o Brasil.